O blog

Este blog foi criado em 2008 para a postagem das minhas colunas que eram publicadas no Infomoney e no extinto A Cidade.
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segunda-feira, 7 de março de 2011

Bomba Russa

Coluna publicada no A Cidade, em 29 de janeiro de 2011

O atentado terrorista no aeroporto de Moscou, que ocorreu esta semana, foi o primeiro na Rússia almejado diretamente a civis estrangeiros. Embora o terror causado seja o mesmo caso os alvos sejam civis domésticos ou estrangeiros, atacar os últimos é um claro sinal de tentar mostrar fragilidades no sistema de segurança russo e amedrontar a população global no início de uma década na qual se espera um grande fluxo de turistas para o país. Em 2014, a Rússia sediará as Olimpíadas de Inverno e, em 2018, a Copa do Mundo de futebol.

Além disso, atacar estrangeiros busca também chamar a atenção do globo para o regime autoritário que se instalou no país desde o fim da União Soviética. Yeltsin, Putin e Medvedev – todos os presidentes desde então – foram patrocinadores da criação de uma oligarquia capitalista que tomou de assalto a economia do país e também são coniventes com um sistema mafioso que administra atividades ilegais no país, como contrabando, tráfico de drogas e mulheres e, mais recentemente, “serviços de proteção” ao patrimônio de empresas estrangeiras.

Tudo isso teve início na década de 90. Logo após o desmantelamento da União Soviética, as únicas atividades econômicas minimamente competitivas deixadas de herança por décadas de um regime socialista eram a fabricação de armas e a exploração de recursos naturais: gás e petróleo, principalmente.

Para desenvolver o país e se financiar, o governo russo abriu seus mercados de bens e capital para o fluxo de capitais estrangeiros e paralelamente iniciou um processo de privatização, que era necessário, já que literalmente toda economia estava sob controle estatal. Mas este processo de privatização foi desastroso, pois configurou-se, na prática, por uma transferência de ativos das mãos do Estado para as mãos de grupos familiares que eram próximos ao governo.

Enquanto isso, o país surfou na onda de liquidez internacional de capital que ocorria em meados da década de noventa que serviu para injetar um grande volume de recursos nestas novas empresas privatizadas. Estas, porém, eram pouco interessadas em se desenvolverem o que não impediu os poucos grupos que passaram a comandar a economia ganharem musculatura financeira. E junto com a riqueza veio a vontade de consumir bens de luxo. Afinal os novos czares da economia não se satisfaziam com carros Lada e demandavam BMWs.

Como eles próprios não produziam BMWs, a solução foi importar. E houve uma enxurrada de bens importados na economia russa provocada não só pela demanda interna de bens de consumo dos mais variados, mas também pela valorização do câmbio que sucedeu àquele grande fluxo financeiro para a Rússia.

Neste processo de perder o controle da exploração de seus recursos naturais e possuir uma economia doméstica fragilizada e altamente dependente de importação, o governo russo ficou refém do endividamento externo para se financiar. Uma configuração insustentável ao menor suspiro dos fluxos internacionais de recursos. E foi o que ocorreu em 1998. Aos primeiros sinais de desconfiança dos investidores estrangeiros, que começaram a perceber que seus recursos estavam sendo usados para consumir BMWs e não produzi-las, o fluxo de investimentos foi recuando até o governo russo declarar moratória de sua dívida e o fluxo cessar completamente.

Até na declaração de moratória o ranço autoritário do governo russo se transpareceu, pois o governo declarou moratória não só da dívida em dólares, mas também da dívida em moeda local. Acontece que nenhum país declara moratória em dívida local, pois basta imprimir moeda para pagá-la...

Desde então, o colapso da economia russa apenas fortaleceu a simbiose entre máfia, oligarquias capitalistas e o grupo de poder, pois para manterem o status quo sem os recursos externos, estes grupos tiveram que se sustentar com apoio mútuo. Desequilíbrios neste jogo de poder tendem a gerar estragos maiores que o ocorrido no aeroporto de Moscou.

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