Programas de milhagem e bônus de cartão de crédito são verdadeiros mecanismos de emissão de moeda. Neste caso, a moeda em questão é usada tão somente para transacionar mais passagens aéreas ou outros produtos à disposição no catálogo do programa.
Nos últimos anos, tem-se observado que os órgãos emissores destas milhas e bônus têm conduzido suas "políticas monetárias" de forma um tanto quanto frouxa, permitindo que a "base monetária" cresça aceleradamente. Os fatores para esta expansão da oferta de milhas e bônus são muitos.
Pelo lado das milhas, a oferta destas tem crescido com o próprio aumento do mercado de transporte aéreo, mas também com os inúmeros convênios que as companhias aéreas fazem entre seus programas de milhagem e outros serviços como aluguel de carros, redes de hotéis e mesmo cartões de crédito. Hoje em dia, nem mais é preciso ter voado uma única vez sequer para obter uma passagem aérea via acúmulo de milhas.
No caso dos bônus, a emissão deste meio de pagamento é atrelada ao dólar. Quanto maior for a conta do cartão de crédito convertida em dólares, mais se ganha bônus. A valorização do real no período recente, portanto, por si só já constitui um fator de expansão de oferta desta moeda. Mas ainda existem agravantes. No início da década, quando a taxa cambial era favorável aos emissores de bônus, os administradores destes programas começaram a flexibilizar suas políticas de emissão quebrando a paridade que até então existia para alguns clientes.
Ou seja, passaram a emitir mais de um bônus por dólar. Não é necessário dizer que estes beneficiados também eram os clientes com potencial de uso mais intensivo do cartão. Isto certamente agravou o efeito da valorização do real descrito acima. Ademais, o cartão de crédito também tem passado por uma escalada de sua base de clientes que certamente contribui para elevação da oferta de bônus.
Qualquer aluno de graduação em economia sabe que um aumento na oferta de moeda significa inflação caso não haja um correspondente aumento no produto total da economia. Não impondo limites à emissão, os administradores destes programas de milhas e bônus provocam tensões inflacionárias em seus mercados. Porém, eles também controlam a produção (bilhetes aéreos, produtos em catálogo) nestes mercados. Neste caso, as opções ao alcance destes programas são:
- Manter os preços expressos em milhas/bônus congelados, mas expandir a oferta de produtos. Uma opção custosa.
- Manter a oferta inalterada, mas aumentar os preços dos produtos. Uma opção impopular.
- Um meio termo entre as duas anteriores: expande-se a oferta via lançamento de novos produtos a preços que já estejam inflacionados.
Esta última opção tem sido a adotada pelos programas por justamente maquiar a inflação, ao mesmo tempo que se passa a impressão de a empresa ter feito um agrado a seus clientes ao aumentar as opções de escolha para conversão de milhas e bônus.
Isto tão é verdade que o próprio site InfoMoney, em matéria do dia (17/04), veiculou reportagem sobre promoções de companhias aéreas na qual dizia que a TAM havia expandido seu programa de milhagem oferecendo alguns trechos nacionais por 3.000 milhas ao passo que anteriormente o trecho mais barato para qualquer lugar da América do Sul custava 10.000.
Ótimo! Agora, pode-se obter uma passagem gastando 30% do que se gastava anteriormente. No entanto, uma checagem dos trechos que fazem parte da dita promoção permite constatar que se estas passagens fossem pagas em dinheiro, a relação de preços seria menor que 30%. Ou seja, estas passagens promocionais estão inflacionadas em milhas.
Nunca ninguém reparou que os preços relativos dos produtos nos catálogos de bônus são totalmente distorcidos se comparados com os preços relativos dos mesmos produtos expressos em dinheiro? Eis uma explicação.