O blog

Este blog foi criado em 2008 para a postagem das minhas colunas que eram publicadas no Infomoney e no extinto A Cidade.
Atualmente publico no jornal O Pinhalense e no site O Financista.
Aproveitem!


sábado, 28 de fevereiro de 2009

Não culpem a bola de cristal

Coluna publicada na Infomoney.com em 27 de Fevereiro de 2009

É comum analistas de mercado, ao projetarem a demanda de um setor ou empresa específica, lançarem mão da utilização de uma elasticidade-PIB para explicar o comportamento futuro do mercado em questão. Mas o que quer dizer essa elasticidade-PIB? E sempre faz sentido usá-la?

A grosso modo a elasticidade-PIB da demanda de um setor, digamos energia elétrica, é a sensibilidade que o mercado de energia tem a variações do PIB brasileiro. Ou seja, tudo o mais constante, uma elasticidade-PIB unitária significa que o mercado de energia elétrica evolui no mesmo ritmo que a economia do país. Se essa elasticidade valesse e o PIB crescesse 5%, a demanda de energia elétrica subiria 5% também.

Análises de mercado embasadas em elasticidades-PIB fazem todo sentido quando existe uma justificativa econômica para se supor que o PIB do país explica este ou aquele mercado específico. A utilização indiscriminada de uma elasticidade-PIB, no entanto, peca pela simplicidade, pela falta de rigor técnico e pelo risco de se fazer relações espúrias, ou seja, relacionar alhos com bugalhos.

No limite, se o analista considera que o PIB explica a evolução de todos os mercados, gera-se um problema de endogeneidade: usa-se o PIB para explicar tudo, quando na verdade é o PIB o que é explicado por tudo. Ademais, estimar elasticidades minimamente confiáveis demanda séries históricas mais longas, que no caso do PIB brasileiro é um pouco complicado obter ainda mais com a sua recente revisão de metodologia de cálculo.

Alternativamente à elasticidade-PIB, o analista pode estimar elasticidades com outras variáveis econômicas mais relevantes para o mercado sob análise, inclusive com a aplicação de modelos multifatoriais. Afinal, nada é tão simples para ser explicado por uma única variável. No rol de opções de outras variáveis econômicas estão a produção industrial por subsetor, dados de emprego e renda, importações e exportações, índices de preços entre outros.

A questão que surge é: existe demanda para este tipo de análise um pouco mais aprofundada por parte do analista? Primeiramente, para partir para uma análise com diversos fatores, o analista precisa do suporte de outra área de pesquisa que projete estas outras séries utilizadas em seus modelos de mercado. De que adianta modelar a demanda de energia elétrica usando a taxa de ocupação da população se ninguém vai fornecer posteriormente os inputs de projeção desta taxa de ocupação?

Ainda assim, alguém acreditaria mais ou acreditaria menos em uma análise de mercado embasada em modelos de maior sofisticação em relação às análises com elasticidade-PIB? E se todos estão satisfeitos "comprando" relatórios com elasticidade-PIB, por que o analista se sentiria compelido a mudar seu método de projeção?

Ou seja, a melhora nas análises de mercado que empresas e analistas elaboram deve ocorrer a partir do momento que os consumidores destas análises demandarem maior aprofundamento e rigor. A bola de cristal das projeções econômicas existe e funciona. Só é preciso saber manuseá-la.

domingo, 1 de fevereiro de 2009

Fórum Social (?) Mundial (?)

(coluna publicada na Infomoney e no A Cidade em 31 de Janeiro de 2009)

Esta semana, em Belém do Pará, teve início o Fórum Social Mundial 2009. Como o site do próprio Fórum diz, o objetivo deste encontro de movimentos sociais é estimular o debate, a reflexão, a formulação de propostas, a troca de experiências e a articulação para a construção de um outro mundo, mais solidário, democrático e justo.

Não precisa passar para o segundo parágrafo que versa sobre seus objetivos para compreender que o Fórum é impotente para não dizer que beira a inutilidade. Vejam bem: um encontro que visa "construir um outro mundo", que não prevê um plano de ação, que não possui representantes com posições executivas em governos ou empresas e que só se propõe a fazer debates ou reflexões nunca vai conseguir construir algo efetivamente. Construção só com falatório não existe, ainda mais se tratando da construção de um novo mundo.

Consultando a programação do evento, verifica-se que há nada mais nada menos que 1.964 atividades programadas para ocorrerem durante os seis dias do Fórum. Entre as atividades previstas estão um painel sobre a relação do movimento de catadores com a globalização econômica, uma mesa de diálogo com o tema "Petrobras Assassina" e um seminário sobre meio século de "vitórias do povo cubano". Pode-se imaginar que estes exemplos são as exceções do evento. Mas não são.

Já que o Fórum tem finalidade social, resolvi procurar por atividades que diziam respeito ao problema da pobreza e da fome na África. Resultado da pesquisa? Zero. Nenhum evento previsto sobre o tema. O fórum que se diz social e se diz mundial dá as costas para o lado mais pobre do planeta.

Com uma rápida visita ao site do outro Fórum, o Econômico Mundial de Davos, pode-se constatar que de fato o de Belém é o contraponto do primeiro. Afinal, o de Davos possui o que o Fórum Social não foi capaz de desenvolver em nove anos: ações concretas. Neste site existe um link exclusivo para o acompanhamento de todas as iniciativas e planos de ação desenvolvidos pelo Fórum Econômico ao longo dos últimos anos. Existem, inclusive, algumas iniciativas de cunho social. Aliás, o Fórum suíço é explícito, em seu site, ao dizer que o progresso econômico sem o desenvolvimento social não é sustentável.

Enquanto de um lado do mundo existem discussões e discursos prolixos, do outro existem debates e iniciativas visando à tomada de decisões e atitudes concretas.

Não é necessário dizer que enquanto o Fórum Econômico é uma organização sem fins lucrativos sustentada por doações da iniciativa privada, o Fórum Social custou este ano R$ 90 milhões, dos quais R$ 80 milhões foram doados pelo Governo Federal. O que realmente querem aqueles que vão a Belém?