O blog

Este blog foi criado em 2008 para a postagem das minhas colunas que eram publicadas no Infomoney e no extinto A Cidade.
Atualmente publico no jornal O Pinhalense e no site O Financista.
Aproveitem!


sábado, 25 de abril de 2009

Finanças Islâmicas

Coluna publicada em Infomoney.com.br em 1 de Fevereiro de 2008

Se você ainda não ouviu falar, certamente começará a ouvir cada vez mais sobre as finanças islâmicas. Os produtos financeiros deste segmento têm como característica seguirem os preceitos da Sharia, o conjunto de leis que regem o islã. Desta forma, alguns requisitos nestes contratos financeiros devem ser atendidos.

Entre estas características peculiares, algumas chamam mais a atenção, como a proibição da cobrança de juros (Riba). Os empréstimos são permitidos, mas o credor recupera seu investimento através de um esquema de compartilhamento dos lucros do devedor. Os financistas são obrigados a compartilharem os riscos com o tomador dos recursos. Assim, estas formas de financiamento se assemelham a um contrato de leasing e as instituições islâmicas acabam atuando como se fossem um fundo de private equity. Criam-se incentivos para os tomadores investirem em atividades produtivas.

Investir em certas atividades é proibido nestas linhas de financiamento. Entre estas atividades estão bebidas alcoólicas, fumo, carne suína, pornografia e armamento. No Brasil, um fundo de ações com a proposta de seguir a Sharia com papéis da Souza Cruz, AMBEV e Forjas Taurus seria algo impensável.

Os produtos financeiros islâmicos estão ganhando popularidade nos EUA e Inglaterra. Nos dois países, estes instrumentos já não são ofertados exclusivamente por instituições financeiras árabes e começam a ser encontrados em bancos como o HSBC e Citibank. Entre os produtos mais populares, estão os contratos de hipoteca. Pessoas que possuíam hipotecas convencionais com juros pós-fixados estão se refinanciando com equivalentes islâmicas de prestações fixas que embutem um lucro pré-determinado para o banco.

Entre os drivers para uma maior expansão deste segmento do mercado no ocidente estão a escalada no preço do petróleo que está fazendo as instituições financeiras do Golfo Pérsico prosperarem. Assim como também prosperam os fundos soberanos desta região que recentemente começaram a injetar capital em bancos ocidentais. O cenário de crescente concorrência entre os bancos e a busca de produtos que atendam nichos de mercado, como foi apontado na coluna de 26/12 (Wired Magazine, the long tail e fundos de investimento, José Brazuna), também fazem este segmento se expandir.

O próprio crescimento da população muçulmana impulsionará o desenvolvimento das finanças islâmicas. Atualmente, estima-se que 22% da população mundial siga o Alcorão, em 2050, este percentual tende a chegar a 27%. No século passado, ao deixarem seus países de origem e virem ao ocidente, os muçulmanos invariavelmente optavam por se "adaptarem" a cultura e costumes locais.

Hoje em dia, os imigrantes estão optando por manterem seus costumes e tradições. Assim como já é possível encontrar no comércio local itens de vestuário, brinquedos (bonecas de burka!) e alimentos especiais. Em breve, testemunharemos as agências bancárias de bairro oferecendo produtos financeiros compatíveis com a orientação religiosa de seus clientes.

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Diversificando prejuízos

Coluna publicada no Infomoney.com.br em 7 de novembro de 2008

Investidores institucionais com portfólios globais passaram, durante a última década, por um processo de diversificação de suas carteiras. Este movimento visava incrementar suas taxas de retorno para além da rentabilidade de títulos de primeira linha, notadamente papéis do tesouro norte-americano.

As opções foram muitas: títulos e papéis oriundos de países emergentes, hedge funds, fundos de private equity, commodities entre outros. Argumenta-se que a diversificação também serviu para tornar menos volátil o fluxo de caixa destes investidores. Assim, para citar o exemplo dos fundos de pensão, a diversificação é positiva pois eleva a rentabilidade destes fundos para que eles cumpram suas metas atuariais ao passo que resguarda o patrimônio dos mesmos de eventuais oscilações cíclicas de curto prazo.

Isto até 2008. Com o início da crise financeira global, a diversificação dos investimentos dos fundos de pensão serviu não só para o compartilhamento de riscos, mas para a disseminação de prejuízos de forma generalizada. O que houve foram quedas, de modo geral, em todas as classes de ativos. As preocupações com uma recessão econômica estão levantando suspeitas sobre a capacidade das empresas de honrarem suas dívidas (afetando o mercado de dívida corporativa) e rebaixando também os prospectos de lucros, o que atinge negativamente o mercado acionário. A desaceleração global também afeta a demanda por commodities e, por conseguinte, seus preços.

Ademais, o processo de desalavancagem que os agentes vêm exercendo gera pressão adicional sobre o preço de diversos ativos e mercados. Neste cenário de queda generalizada, a diversificação torna-se justificável somente sob o argumento que algumas classes de ativos estão caindo menos que outras. Ou seja, o prejuízo dos fundos poderia ser pior caso estivessem concentrados no "cavalo perdedor". E há sempre os casos de conflito de interesse para explicar a diversificação. Neste caso, os gestores dos fundos usam a diversificação de suas carteiras (e a gestão adicional que isto acarreta) como uma maneira de justificar as altas taxas de administração cobradas.

No Brasil, os fundos de pensão entenderam diversificação como tão somente aumento de exposição à renda variável. Isto acabou tendo efeito contrário, causando uma concentração de investimentos dos fundos em papéis deste tipo. Como bem apontou um colega do banco, existem fundos com até 60% do portfólio alocado em renda variável. Se tomarmos a volatilidade do mercado, o valor em risco destes fundos deve ser significativo e incompatível com as obrigações destas instituições frente a seus beneficiários.

Mesmo que tenham cumprido suas metas nos últimos anos devido à forte apreciação do mercado acionário, o risco de se concentrar em ativos voláteis, com retornos pró-cíclicos não pode ser desprezado. Uma diversificação mais salutar neste caso seria aumentar os investimentos em projetos de infra-estrutura, que apresentam fluxos de caixa menos voláteis, ou seja, menores riscos mas ainda assim com retornos atrativos.

No caso brasileiro, isto casaria com a enorme demanda por infra-estrutura do país. Os efeitos multiplicadores destes investimentos possibilitariam um crescimento mais virtuoso da economia tendo desdobramentos sobre o retorno do restante do portfólio destes mesmos fundos, isto é, aumentando o retorno das ações das empresas.

Isto serve para exemplificar que em tempos de crise, não existe resposta pronta para qualquer situação. Assim como a diversificação de grandes portfólios não evitou prejuízos e inclusive colaborou para potencializá-los em alguns mercados, a concentração em ativos voláteis também é inadmissível.

Acionistas batem cabeça em conflitos de agência

Coluna postada no Infomoney.com.br em 23 de maio de 2008

Os custos de agência são as ineficiências geradas pelos diversos conflitos de interesse existentes entre alguns dos stakeholders de um negócio. Entre estas ineficiências, pode-se citar o racionamento de capital (subinvestimento) e outras ações tomadas que não maximizam o valor da empresa para o acionista.

Os conflitos de agência mais conhecidos são entre os acionistas e os administradores da firma, entre os acionistas e os credores e entre os atuais acionistas e os futuros acionistas.

No primeiro caso, os conflitos existem pois os interesses dos administradores nem sempre estão alinhados com os dos acionistas. Administradores têm interesse em se perpetuarem em seus cargos e construir impérios para ganharem visibilidade. Isto os leva a adotar medidas que nem sempre são as melhores para os acionistas, como implementar projetos de baixa rentabilidade só para aumentar a empresa e suas responsabilidades.

Também podem, por outro lado, deixar de investir e acumularem caixa, tornando a empresa pouco atrativa para potenciais compradores e, portanto, usar isso como mecanismo de defesa contra alguma proposta de aquisição que colocaria seus empregos em risco.

Entre acionistas e credores, os conflitos advém do fato dos acionistas em caso de default comprometerem seu capital até o limite do capital social da companhia. Ou seja, uma vez com capital financiado, os credores têm interesse em que a empresa adote projetos mais conservadores, que garantam o repagamento da dívida. Os acionistas, ao contrário, desejam projetos mais arriscados, pois estes possuem um upside maior e o eventual prejuízo é compartilhado com os credores até o limite do patrimônio da empresa.

Atuais acionistas tendem a evitar a emissão de novas ações para o financiamento de projetos em estágios avançados de planejamento, pois os acionistas futuros se beneficiariam do novo fluxo de caixa, mas dada a assimetria de informação dos custos já incorridos pelos atuais acionistas, as novas ações seriam lançadas com um desconto.

Curiosamente, existe um outro conflito de agência menos conhecido que é aquele entre os próprios acionistas atuais de uma empresa. Este tipo de conflito vem à tona quando um dos acionistas possui ações em outra empresa que esteja sendo alvo de aquisição pela primeira empresa.

Nesta situação, o acionista com participação em ambas empresas desejará que a fusão maximize o valor dos acionistas de ambas empresas, ao contrário dos outros acionistas que trabalharão para a maximização do valor apenas dos acionistas da adquirente.

Chega-se a um impasse que invariavelmente resulta na inviabilidade da fusão. Situações como esta chegam a afetar a própria atuação dos administradores da adquirente que, para evitarem frustrações, procurariam não recomendar a compra aos seus acionistas de empresas que provocariam este tipo de conflito. E isto pode resultar em alocações sub-ótimas do capital da adquirente.

Este tipo de conflito é comum entre investidores institucionais, como fundos de pensão, que possuem participações em várias empresas simultaneamente. A forma de mitigá-lo, porém, ainda não é tão clara e óbvia.